Em 1946 Walt Disney, na ocasião já bem-sucedido no segmento de filmes de animação, estava com suas duas filhas em um parque de diversões, daqueles bem simples e malcuidados, que muitos de nós conhecemos na infância.
Naquele momento Walt teve uma visão. Pensou em um lugar limpo, lindo e agradável onde famílias pudessem passar os momentos mais felizes de suas vidas.
Apenas nove anos depois Walt inaugurava o primeiro parque temático da Walt Disney Company – a Disneylândia, na Califórnia. O segmento de parques se transformou em um dos maiores negócios da Disney num momento importante em que a recém-criada TV ocupava o espaço do cinema e deixava algumas produtoras de filmes em situação difícil.
No mesmo ano da visão de Walt, Darryl Zanuck, produtor da 20th Century Fox, afirmou, frente
à invasão da telinha: “a televisão não vai se sustentar por muito tempo. Logo
as pessoas vão se cansar de olhar para uma caixa de madeira toda noite”. Somente
hoje, 70 anos depois, a TV começa a ruir diante da invasão da Internet, pela
mesma razão pela qual Zanuck enfrentou dificuldades naquela ocasião:
mentalidade fixa.
Walt, por sua vez, tinha uma mentalidade de crescimento, ou seja, se permitia olhar as situações sob um ponto de vista diferente e assim conseguia visualizar novas oportunidades. Quem assistiu o filme “Walt antes do Mickey”, uma verdadeira lição de persistência, sabe do que estou falando. Ter uma mentalidade apropriada para um empreendedor foi um fator decisivo para o seu sucesso.
Guardadas as proporções, aos 15 anos tive o meu primeiro emprego de carteira assinada, como empacotador em um supermercado. Todos os rapazes que trabalhavam naquela função faziam um trabalho ruim porque ganhavam pouco. Eu sabia que precisava ser o melhor naquilo se quisesse ser reconhecido. Aos 17 anos já era líder de setor.
Anos depois, quando me tornei professor universitário, quase todos os colegas achavam que os alunos não mereciam o empenho do professor. Eu nunca entrei em sala de aula se não fosse para fazer o melhor que pudesse. Em dois anos me tornei coordenador do curso e hoje sou palestrante nacional, além de ministrar, todos os anos, um treinamento de imersão para líderes e empreendedores brasileiros em Orlando (EUA), dentro do complexo Disney. Adotar uma mentalidade (Mindset) de crescimento fez toda a diferença.
Mas o que é Mindset?
Mindset significa mentalidade ou predisposição psicológica, uma forma de pensar que determina nossos comportamentos e por consequência nossos resultados.
Todos os dias avaliamos situações e tomamos decisões baseados numa programação existente em nosso cérebro. Quando essa programação não muda de acordo com nossos objetivos ou necessidades, temos um mindset fixo.
Quando essa programação muda para se ajustar às mudanças externas e aos nossos objetivos, temos um mindset de crescimento. Para mudar o seu mindset, você deve se abrir a novas ideias, novos conhecimentos e novos hábitos.
É importante dizer que em 2017 a Disney teve três vezes mais visitantes que o seu principal concorrente, que está posicionado nos principais lugares do mundo onde ela está, mesmo a Disney tendo os ingressos mais caros do setor.
Nas palavras dos especialistas do Disney Institute: “os resultados consistentes dos negócios da Disney são motivados pelo foco estratégico em certas funções de negócios e oportunidades nas quais as empresas muitas vezes não conseguem ver o valor e o potencial – e isso é o que nos diferencia. Nós aprendemos a ser intencionais onde os outros podem ser não intencionais”.
Quero convidá-lo, como um gestor, a incorporar em sua mentalidade algumas lições de negócios da Disney, responsáveis pelos resultados extraordinários em seus negócios.
Então vamos ingressar um pouco mais nessa mentalidade.
Diretrizes da mentalidade Disney
O quadro abaixo mostra 8 diretrizes do jeito de pensar da Disney, responsáveis em grande parte pelo seu sucesso, na forma de um comparativo com o que seria uma mentalidade fixa:
Mindset Fixa
Miopia de Marketing: nosso negócio é o nosso produto. |
Vamos pra briga com todo mundo. |
Vamos reduzir custo e brigar por preço. |
Temos que treinar nossa operação para resolver os problemas. |
Precisamos contratar pessoas com boas competências técnicas. |
As pessoas são movidas por estímulos financeiros. Ofereça dinheiro e elas fazem o que você quer. |
Não podemos investir muito em treinamento e integração porque nossa rotatividade é alta. |
Propósito é mais uma moda. |
Mentalidade Disney
Concorrente é toda empresa com a qual o cliente nos compara. |
Com quem podemos fazer parcerias? |
Não somos uma empresa baseada em preço, estamos empenhados em gerar mais valor. |
Tudo começa com a liderança. |
Nós contratamos atitudes. |
Todos são importantes, e todos precisam serem motivados por líderes que gostem de pessoas. |
Precisamos criar cultura forte para aumentar o engajamento e reduzir a rotatividade. |
“Nós não fazemos filmes para ganhar dinheiro. Nós ganhamos dinheiro para fazer mais filme.” (Walt Disney) |
Mudança de Mindset
1 Fuja da miopia de Marketing
Quando criou a Disneylândia, em 1955, Walt enxergava o segmento em que atuava como sendo “entretenimento” e não “filmes”. Isso fez com que a empresa voltasse sua atenção para todas as oportunidades dentro de um segmento maior, enquanto as demais produtoras se ocupavam de tentar ser melhor que os concorrentes diretos.
Você pode estar certo de que a maior ameaça ao seu negócio, no médio prazo, são empresas que fabricam produtos ou prestam serviços diferentes dos seus. A Disney disputa excedente de renda, ou seja, concorre com a compra de um carro novo, um curso de pós-graduação e uma cirurgia estética, só pra citar alguns exemplos. Hoje a Disney vai além, dizendo que “concorrente é toda empresa com a qual o cliente nos compara”.
2 Escolha seus parceiros, depois seus concorrentes
Walt Disney não tinha recursos para construir a Disneylândia, mas tinha uma grande popularidade nos EUA. Ele decidiu procurar a ABC, rede de TV criada na época, e que num primeiro olhar seria seu concorrente, e ofereceu um produto chamado “The Mickey Mouse Club” – um programa pautado nos personagens da Disney, apresentado por ele, que duraria todo o dia de domingo.
A ABC topou e, ao invés de receber honorários e direitos autorais, Walt recebeu os recursos para construir o parque. Em apenas 1 ano e 1 dia seu sonho estava realizado. Para competir em um mercado agressivo, primeiro você deve escolher seus parceiros, depois seus concorrentes. Existem inúmeras oportunidades de criar sinergia com outros players, desde que você esteja disposto e saiba fazer as escolhas certas.
3 Ofereça mais valor ao seu cliente
Empresas que não conseguem oferecer uma proposta de valor diferenciada estão sujeitas à concorrência por preço e, atualmente, se você não é muito grande, não terá escala suficiente para disputar mercado dessa forma. Então a solução é encontrar um nicho de mercado ou desenvolver um diferencial mais difícil de ser copiado. Mas de forma equivocada, a maioria continua se concentrando em baixar custos, sendo que muitos dos cortes acabam atingindo em cheio o valor que deveria entregar ao cliente.
A Disney gasta 60.000 dólares todos os dias para produzir o show de fogos no Castelo da Cinderela, no Magic Kingdom. No ano, somam mais de 20 milhões. Qualquer gestor diria que é muito dinheiro literalmente queimado.
Mas como todos os dias em torno de 60.000 pessoas entram naquele parque, o custo do show é de 1 dólar por pessoa. Se você oferecer a elas trocarem o show por um desconto de 1 dólar, será difícil encontrar alguém que aceite a oferta. Eu diria que a maioria não trocaria nem por um desconto de 10 dólares. Neste caso, cortar custos não é uma alternativa.
4 Sempre comece pela liderança
Todos os meses sou contratado para treinar equipes de serviços, atendimento e vendas, e poucas são as empresas que decidem treinar também os seus líderes. A maior parte pensa que treinando sua operação, todos os problemas de qualidade de serviço e atendimento serão resolvidos.
Esquecem que a maioria das pessoas possui habilidades razoáveis, mas peca em questões comportamentais. E os comportamentos das pessoas são determinados, em muito, pelos comportamentos dos seus líderes.
A Disney desenhou a Cadeia da Excelência partindo da liderança para alcançar resultados financeiros. Para a empresa, todo treinamento precisa começar por quem tem o poder de influenciar o comportamento das pessoas da operação.
5 Contrate atitudes
Habilidades técnicas são bem mais fáceis de produzir do que mudanças de atitudes. Por isso a Disney opta primeiro pelas atitudes alinhadas à sua cultura e modo de pensar, para só então buscar ou desenvolver habilidades técnicas.
Quantas vezes você contratou pessoas pelo currículo e precisou demitir por questões comportamentais? Lembre-se sempre do que disse o milionário Warren Buffett: “Procurando pessoas para contratar, você busca três qualidades: integridade, inteligência e energia. E se elas não têm a primeira, as outras duas matarão você.”
6 Motive todos, cada um do seu jeito
Não importa a função de uma pessoa, ela deve ser motivada segundo os estímulos relevantes para si. Para a Disney toda as pessoas são importantes, razão pela qual todos os seus programas de reconhecimento são aplicáveis a todos os seus funcionários (chamados de “membros do elenco”).
É importante observar também que algumas pessoas são orientadas para tarefas, outras para carreira, e outras ainda para vocação. Isso faz com que respondam de forma diferente aos estímulos criados pela empresa.
Em todas as visitas que faço aos bastidores da Disney para levar nosso grupo do treinamento em Orlando, observo o quanto a empresa consegue compor uma equipe rica com pessoas de diferentes perfis, seja de gerações diferentes, seja de personalidades diferentes.
7 Invista em uma cultura forte
A abertura da Disneylândia em 1955 não foi como esperado. Walt convidou 15.000 pessoas para a inauguração, mas alguém falsificou convites e apareceu o dobro de pessoas.
Muitos problemas surgiram naquele dia porque os funcionários não estavam preparados para tomar decisões e resolver problemas, ou seja, não havia uma cultura de excelência disseminada.
Então Walt contratou um cara chamado Van France para iniciar o que mais tarde se tornaria a Universidade Disney, responsável pelo treinamento e pela cultura da empresa, fatores determinantes da sua baixa rotatividade.
Se você pensa que sua empresa não consegue estabelecer cultura porque a rotatividade é alta, experimente primeiro construir cultura, e verá sua rotatividade despencar no médio prazo.
8 Tenha um propósito claro e forte
Embora só há alguns anos o tema Propósito tenha se tornado comum, sua essência está diretamente ligada à evolução do ser humano. Hoje nos organizamos em sociedade, empresas, países, grupos, sempre pautados em propósito, embora nunca paremos para transformar o sentimento que nos une em uma frase de impacto. Nos últimos anos tenho ajudado empresas a descobrirem e incorporarem seu propósito, e os resultados têm sido fantásticos.
A Disney tem como propósito “Gerar Felicidade” e esta frase simples tem um poder enorme de mobilizar os 194.000 funcionários que trabalham ao redor do mundo. Não é à toa que seus resultados em termos de fidelização de clientes e engajamento de pessoas é extraordinário.
Quando conheci a Inside Sistemas fiquei curioso por entender seu Propósito de “Contribuir com o Sucesso e a Liberdade do Cliente”. Mas quando estive na empresa, participando da convenção anual e ministrando treinamentos, não foi necessário me explicarem.
Quando o propósito é forte você pode senti-lo nas atitudes dos líderes e das demais pessoas. Sua empresa também pode ter um propósito que impulsione seu negócio a voar mais alto e conquistar o impossível. Acredite.
Nada pode ser mais determinante para o sucesso quanto a mentalidade estabelecida. Uma cultura inadequada engole a estratégia e a impede de prosperar. Por sua vez, uma mentalidade fixa engole a cultura e a impede de evoluir. Ocupe-se de promover uma mentalidade de crescimento no seu negócio, inspirado pelo Mindset Disney e os resultados serão surpreendentes.
Sobre o autor
Cláudio Vicente
Administrador, MBA em Marketing pela FGV, Mestre em Eng. de Produção, Experiência de 20 anos em Gestão, atuou como executivo de empresas de serviços, incluindo a função de Superintendente Executivo e Diretor de Marketing de clube de futebol da Série A do Campeonato Brasileiro. Coordenou cursos de Administração e Contábeis e atualmente é professor de Pós/MBA da FGV, UNOESC, CESUSC e UNISOCIESC, e coordena o curso de Pós em Liderança Estratégica. Sócio e palestrante do Instituto FOCO, realizou mais de 600 palestras e cursos sobre Serviços, Atendimento, Vendas, Negócios e Liderança. Estudioso do Modelo Disney, realizou treinamentos oficiais do Disney Institute e anualmente ministra treinamentos no Walt Disney World em Orlando (EUA).
Contato: claudio.vicente@institutofoco.com.br
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